sábado, outubro 30, 2010

O jogo está na mesa...

(continuação do texto 'Sábado à noite')
...
- Mas o que é ser especial?
- Então, essa, definitivamente, é uma excelente pergunta... Não sei... Ser especial é ser você, é não se preocupar... Ou melhor, se preocupe, mas não a ponto de você se perder. [É] Entender que você, por mais que se esforce, nunca, eu disse nunca, vai conseguir agradar a todos.
Ela demonstra surpresa – É...
- Você deve agradar a si, aos seus pais e aos que verdadeiramente te amam... Não importa, sempre vai ter aquele invejoso ou estúpido que se passa de amigo te dizendo o que fazer e o que não fazer, te dizendo que não gostou do seu cabelo, da sua roupa, da sua leitura nova, tudo que você fizer de diferente, pronto, fodeu! Ele, por ser medíocre, vai querer destruir qualquer tentativa tua de ser diferente, de agir diferente, de pensar diferente.
- E como é uma garota especial para você?
- Pergunta ruim... Você sempre alterna boas e ruins? Uma pessoa não deve viver em função de outra, entende o que eu digo? Você tem seu caminho, eu tenho o meu. Se um dia eles se convergirem para o mesmo caminho, ótimo! Talvez seja essa a indicação melhor que eu sou “o certo” para você. Não é apontar pra você e dizer: “Aquela é especial para mim”. Não funciona assim... Ei, to falando muito, não gosto disso. Até agora só sei o seu curso e que você tá interessada no que tenho para falar e sei de alguns detalhes seus que eu fui pegando nessa conversa, não sei, por exemplo, seu nome?
- Nossa, gente, é verdade! Me desculpa, me chamo Camila.
- É um prazer saber seu nome, Camila. O que lhe atrai além do Vade Mecum?
Risadas inesperadas fogem daquela pequena mesa mal-iluminada – Muitas coisas, mesmo. Gosto de viajar, de um bom livro, de assistir novelas, filmes...
- Teatro, gosta de teatro?
- Nunca fui, adoraria conhecer esse mundo.
- Isso é bom de ouvir, alguém aberto a novas experiências, o que mais você gosta? Que tipo de música?
- Amo música, não tenho preconceito com músicas, gosto de ouvir qualquer uma, tem aquela ou outra que sou apaixonada. Qual você gosta mais?
- Um rock, um velho rock, daqueles que te fazem gritar durante um solo de guitarra, um velho AC/DC, Jimi, Zepellin, Doors e tantos outros.
- Eu gosto de rock, gosto do rock brasileiro, do antigo claro.
- Querem alguma coisa? – O garçom interrompe aquela conversa.
- Dois refrigerantes, pode ser? - Carlo olha para Camila.
- Pode sim – Ela responde.
- Okay, então! Dois refrigerantes, algo mais?
- Mais uma batatinha – Ela pede.
- Anotado.
Voltam a conversa - O que mais, livros, que autores te agradam?
- Ai, são tantos, não tenho um autor em específico, gosto de sair lendo...
- Pegar aquele livro na prateleira e ler feito uma louca. – Ele completa.
- É, como você sabe?  – Ela sorri. – Você é assim, também?
- Claro! Tem coisa melhor do que se jogar à sorte?... Só que ultimamente tenho lidos alguns em específicos...
- Quais?
- Alguns, uns velhotes que já morreram na sua maioria, Buko, García Marquez, Kafka, Balzac, uma galera assim...
- Só conheço o García Marquez, quais livros dele você já leu?
- Minhas putas tristes e um romance... Não “tô” lembrando o nome...
- Cem anos de Solidão?
- É, esse mesmo, você já leu pelo visto.
- Li sim, adorei o poder de descrição que ele tem.
- É, me inspiro muito nele quando vou descrever algo, gosto de detalhar bem as coisas como ele fazia e ainda faz.
...

 E eles conversaram, beberam seus refrigerantes e comeram, conversaram mais um pouco e ele olhou para aquele relógio pendurado bem atrás do balcão principal acima da estante que tinha algumas bebidas de nomes extravagantes e viu que já era tarde, só não sabia para o quê, talvez fosse hora de sair e guardar um pouco daquilo para outra hora, mesmo sabendo dos riscos de desencontro, sabia também que não seria bom queimar tudo de uma só vez. Ela insiste, quer saber sobre o que ele observara nela e tantas outras coisas que a interessaram, e ele se despede dela, avisa sobre um possível futuro encontro, pede a ela paciência, pede a conta. Ele deixa uma nota de vinte e outra de dez junto com o papel riscado com números.
Ele sai daquilo. Caminha olhando para a lua que não era tão bonita, talvez fossem aquelas nuvens, talvez fosse a lua ou talvez fossem os seus olhos. Chega ao carro, gira a chave, baixa o vidro e dá uma nota ao homem que olhava os carros.
Ela volta para a branca e para a namorada do amigo dele e para o amigo dele, conversam por mais alguns momentos, sempre olhando de forma discreta para aquela pequena mesa mal-iluminada e no canto do bar que já tinha um novo casal rindo.


Lucas Sales Viana

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